DE SURPRESA AO FORTE PRÍNCIPE DA BEIRA
Desde a chegada à Surpresa, as 4:00 horas do dia 07 de julho, uma espessa neblina cobria o Rio Mamoré de um lado e a Serra da Cutia na margem brasileira, dando esperança de que o dia seria quente e que a chuva havia deixado a expedição do FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé. O primeiro contato com o sol foi por volta das 9:00 horas, que veio com as características da região: quente e forte.
Surpresa é um distrito da cidade de Guajará-Mirim distante da sede a quase 30 horas pelo rio, a única forma de acesso à comunidade, pois não há estrada que a ligue a outras cidades em função do Parque Nacional da Serra da Cutia. Do parque até a cidade de Guajará-Mirim destaca-se um dos territórios ainda de floresta Amazônica não devastado pela ocupação da fronteira agrícola, ladeado pelo Parque Nacional dos Pacaás Novos a nordeste e o Parque Estadual de Guajará-Mirim ao norte, com o Rio Mamoré cortando a outra face de sudeste à noroeste. Em frente à cidade destaca-se uma grande ilha, ponto de encontro entre os Rios Mamoré, que vem serpenteando a Bolívia desde os altiplanos andinos e o Rio Guaporé, cujas nascentes estão localizadas no estado do Mato Grosso.
Surpresa possui uma população de cerca de 1.000 habitantes, composta a sua maioria por crianças e adultos acima dos 30 anos, pois os jovens quando chegam a idade do ensino médio, partem para os grandes centros em busca de estudo e trabalho. Não há índices de violência e acidentes de trânsito – todo trajeto pelas ruas de terra é feito de moto ou a pé. Segundo os moradores, este isolamento de certa forma traz paz à comunidade, sendo este um “dos motivos que faz com que sejamos felizes e não querer sair daqui”.
Para os moradores a única coisa complicada da comunidade é quando alguém precisa de atendimento grave de saúde, já que uma voadeira daqui a Guajará custa quase mil reais e quem não tem dinheiro para pagar pode até morrer. Uma senhora disse ao FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé “somos irmãos, quando um precisa todos se unem”. Um pequeno posto de saúde está sendo construído no local para o atendimento básico, quem sabe sinal de que as pessoas serão ainda mais felizes.
Na noite de exibição do FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé, no dia 07 de julho, aos moradores do distrito juntaram-se os membros do Território Indígena Sagarana, composto por 72 famílias com cerca de 302 pessoas da língua Chapadura. A comunidade indígena vive da coleta de castanhas, principalmente entre os meses de dezembro a fevereiro e vieram à exibição em dois grandes barcos, retornando logo após o término das atividades.
O barco E. Canuto zarpa de Surpresa logo após a exibição do FestCineamazônia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé, que lotou a praça da comunidade durante a noite. Céu um pouco nublado, mas é possível contemplar a impressionante beleza das estrelas em regiões sem o brilho das luzes das cidades. As Plêiades e as constelações de Sagitário e Câncer são as mais luminosas e o risco da Via Láctea ocupa a abóboda celeste. Pouco mais de uma hora de navegação o FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé cruza pela Baia Azul, lugar que mesmo a noite impressiona por sua beleza iluminada pela Lua que surge entre as nuvens que voltam a encobrir o céu.
Durante a madrugada o FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé passa por locais como vários Territórios Indígenas, a Fazenda Cangaceiro, a Baia Rica, o Corte dos Índios e a Volta Grande. Este trecho do Guaporé tem uma característica interessante: a Volta Grande é uma curva com cerca de 12 Km navegada entre 2 a 3 horas, mas em época em que o rio está com águas abundantes como agora, os barcos cruzam direto pelo chamado Corte dos Índios, um caminho quase reto de cerca de 2 Km de extensão que encontra as pontas dos meandros, o que vamos encontrar em outros trechos rio acima.
Por volta das sete da manhã o FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé cruza pela Baia das Onças, cujo nome faz referência a grande presença do felino na região e onde se inicia uma grande curva com mais de 15 Km, terminando na comunidade de Chicó, onde está instalada a antena de internet da comunidade de Surpresa.
Deste ponto para a frente é nítida a mudança de paisagem. Antes dominada por terras pretas e barrentas, em grande parte com a presença do gordião, árvore de flores pequenas e frutos vermelhos, alimento preferido do Tambaqui que salta da água para pescar a fruta nas alturas, a margem brasileira aos poucos vai sendo substituída por uma terra mais avermelhada e firme e pela presença da Auricuri, palmeira plantada em antigos roçados e cujas folhas são usadas como telhados das casas ribeirinhas. As árvores de médio porte vão sendo gradativamente substituídas por uma vegetação mais baixa e de pequeno porte.
A mudança de paisagem traz também o início da região onde a Floresta Amazônica está sendo substituída pela soja cultivada em grandes extensões de terra, distantes alguns quilômetros – ou mesmo centenas de metros, das margens do Guaporé. Até este trecho, a Serra dos Parecis, que nos acompanha desde longe, é um obstáculo natural a mudança de uso da terra, sendo a região do Forte Príncipe da Beira o final da barreira.
Esta é uma das realidades da região e da própria Amazônia. Comunidades isoladas sem investimento dos governos locais obrigam as populações a se deslocarem para grandes centros com a venda, a preços baratos, de suas propriedades, geralmente para grandes grupos econômicos que, por força do capital, implantam vastas áreas de soja e gado e ao mesmo tempo detêm o poder de definição de políticas públicas, como abertura de estradas ou mesmo modificações na legislação ambiental.
Durante o dia de navegação o FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé passa por belezas naturais ainda preservadas, como os lagos Brasil e Melquíades, o estirão do Dioclécio e algumas poucas fazendas, como a Fazenda Araras. Este local, de acordo com os tripulantes do barco, até alguns anos atrás era ponto de reprodução de várias espécies de araras, mas o contrabando de animais silvestres fez com que a população de aves fosse quase extinta.
O trecho final até a próxima exibição FestCineamazônia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé, no Forte Príncipe da Beira, fortaleza considerada uma das maiores edificadas pela engenharia militar portuguesa no Brasil Colonial, foi realizada sob um vento moderado e frio e com a chegada de nuvens de chuva, de acordo com a previsão da meteorologia em função da frente polar que chegou ao país.
A chegada do FestCineamazonia Itinerante 2015 – Vale do Guaporé ao Forte ocorreu no final do dia 08, as 17:30 horas.
O Festcineamazônia Itinerante 2015 tem o patrocínio do BNDES, Governo Federal, Ministério da Cultura, Secretaria do Audiovisual, Lei Rouanet, apoio cultural da Prefeitura de Porto Velho, através da Funcultural, Fundação Cultural de Porto Velho, Sema, Secretaria Municipal do Meio Ambiente e IPHAN.
O Festcineamazônia é membro do Greenfilm Network e do Fórum dos Festivais.
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